“Um amigo meu saiu maravilhado depois de assistir a Avatar. Não parava de falar das montanhas flutuantes. E eu disse a ele: ‘Cara, seu planeta tem montanhas gigantescas de água. De água. Que flutuam em cima da sua cabeça todos os dias e quando viram chuva contribuem para o ciclo do líquido mais importante da sua existência’. A maioria vai de um lugar para o outro sem se dar conta da complexidade, maravilha e encantamento que é uma nuvem”. – Ibrahim César, 1001 Gatos de Schrödinger
E se eu lhe disser que ainda mais impressionante que os efeitos tridimensionais dos smurfs gigantes, são os próprios óculos que você deve ter usado no cinema, e como eles podem elevar o “mistério central” da física quântica a algo verdadeiramente absurdo… mas completamente real? Tão real que pode estar agora mesmo frente a seus olhos, e no entanto, como uma montanha de água com a massa de dez mil aviões 747 flutuando no céu, passa despercebido?
Depois de um breve lapso, é mais uma coluna Dúvida Razoável, iniciando uma série na continuação.
O Mais Belo Experimento
Em 2002, leitores da respeitada revista do Institute of Physics de Londres elegeram o experimento da dupla fenda como o mais belo experimento da física. Ele também foi considerado como o “mistério central” da física quântica pelo tocador de panelas, Richard Feynman. São indicações de que pode valer a pena conhecer um pouco mais sobre ele – não se preocupe, você não irá entendê-lo, até porque ninguém jamais o entendeu realmente.
E, no entanto, qualquer um pode reproduzi-lo, de forma idêntica àquela que Thomas Young o realizou há mais de dois séculos: usando um pedaço de cartão – pode ser mesmo uma carta – para dividir um raio de luz. Claro que, ao contrário de Young, que lidou com um quarto completamente escuro e contou com os raios do Sol, você pode preferir usar um feixe laser ao invés. Os princípios serão os mesmos.
O que acontecerá com o raio de luz dividido? Young relatou à Royal Society “as franjas de cor”, que ele explicou serem “produzidas pela interferência das duas porções de luz”. Você também poderá observar essas franjas de interferência, e a interferência demonstra que a luz é uma onda. Simples assim.
Os dois feixes interferem um com o outro e se intensificam ou anulam em pontos diferentes. Isso não aconteceria se a luz fosse composta de partículas, como muitos, incluindo Isaac Newton, defendiam. “Nem mesmo a pessoa mais obtusa poderá negar que a afirmação [de que a luz é uma onda] é provada pelos experimentos”, escreveu Young. E não havia como negar.
Pois bem, isso pode ser belo, mas não deve ser muito misterioso. O “mistério” está no fato de que, ao contrário do que acabamos de provar, a luz é composta de partículas. Demonstrar isso é um tanto mais complicado do que lidar com feixes de luz divididos por cartas, mas vale notar que uma das demonstrações da existência de partículas de luz, os fótons, através da explicação do efeito fotoelétrico, rendeu a um certo Albert Einstein o prêmio Nobel – não, não foi pela tal da Teoria da Relatividade. A célular solar em uma calculadora demonstra que a luz é composta de partículas.
Se a luz fosse composta de partículas, contudo, isso também não seria tão misterioso.
O “mistério central” está no fato de que a luz é tanto onda como partícula. Tanto Young como Einstein estão certos. A luz é capaz de produzir padrões de interferência, como o experimento da dupla fenda demonstra, mas só existe em pacotes discretos de fótons individuais, como o efeito fotoelétrico demonstra. Entendeu?
Bem, ninguém realmente entende. E o experimento de dupla fenda pode se tornar ainda mais incompreensível ao demonstrar o mistério central da física quântica com uma variação simples: fazendo com que apenas um fóton seja emitido de cada vez.
O que acontece? Na próxima coluna.