A Ciência é Universal. Como lembrava o astrônomo Carl Sagan, físicos budistas trabalham com as mesmas equações que físicos muçulmanos, hindus, ateus ou cristãos. “Todos descobrem as mesmas leis da natureza. De repente, não depende da cultura local, da educação local. O que os físicos dizem parece ser verdade por todo o planeta Terra. E então você olha para os outros planetas. Outras estrelas. Outras galáxias. E as mesmas leis se aplicam em todo o lugar”.
Neste exato momento, as sondas espaciais Voyager e Pioneer viajam pelo espaço interestelar. Elas já se encontram no grande vazio entre as estrelas, entre aquela que chamamos de Sol e todas as bilhões e bilhões de outras de nossa Galáxia. Viajam audaciosamente para onde nenhum objeto humano, que se dirá de um homem, jamais esteve. E seus componentes eletrônicos continuam funcionando, como projetados em nosso planeta há mais de três décadas. Sabemos disto porque ainda recebemos os sinais da Voyager 2. A ciência ainda funciona por lá.
Assim como funciona com a brincadeira do copo. O mistério foi solucionado por um físico inglês poucos anos depois de se tornar conhecido, há mais de 150 anos. Hollywood, infelizmente, não ficou sabendo. Mas você pode não só descobrir a verdade, como testá-la por si mesmo.
CDS GIRANTES
Um experimento simples permite saber se realmente há algo sobrenatural na brincadeira. Tudo de que você precisará para fazê-lo é um punhado de CDs e fita adesiva. Além de um copo, claro.
Primeiro, fixe um CD sobre o fundo do copo com a fita adesiva. Depois, empilhe mais alguns CDs sobre ele – no mínimo três. Você pode usar discos da Xuxa ou CDs de instalação do Windows. Pode deixar tudo mais assustador.
Então chame a turma para uma brincadeira do copo supimpa com o toque moderninho dos CDs. Basta fazer como de costume, mas colocando os dedos sobre a pilha de discos, sem tocar o copo.
Agora, aqui está o segredo para detectar espíritos de verdade: esteja seguro de que a pilha de CDs possui pouco atrito. Se houver pouco atrito entre os CDs, será difícil movimentar o copo mexendo o CD ao topo. O que você está tentando fazer aqui é um experimento controlado. No caso, terá controlado melhor a possibilidade de que alguém consiga mexer o copo.
Não apenas isso, a pilha de discos também permite detectar melhor a origem do movimento. Confira a imagem abaixo e note como a pilha de CDs está deslocada, formando uma escada. Se você obtiver este resultado, será importante saber para onde o copo se moveu.
Se o copo tiver se movido para a esquerda, isto significará que a pilha de CDs se moveu primeiro nessa direção, começando no topo. É a pilha de CDs que arrasta o copo, e são seus dedos que movimentam a pilha de CDs. Nenhum espírito em ação.
Já se o copo se movimentar para a direita, então será o copo a puxar a pilha de CDs. Mas antes de sair correndo por ter encontrado espíritos “de verdade”, já que você chegou até aqui, talvez seja mais esperto tentar verificar melhor se os CDs estão mesmo livres de atrito. Ou mesmo se não é a mesa que se mexeu.
Para controlar ainda melhor estas outras possibilidades, você pode tentar colocar uma pilha de CDs debaixo do copo. Ou talvez simplesmente fixar bem a mesa ou fazer a brincadeira no chão.
Este experimento foi realizado pela primeira vez em 1853 pelo físico inglês Michael Faraday. Evidentemente não com CDs – uma excelente adaptação moderna sugerida por Widson Reis. A experiência original foi feita com papéis-cartão e envolveu mesas girantes, porém a idéia é a mesma.
Os resultados vêm sendo coerentes desde então. São as mesmas leis da natureza descobertas por espíritas, cristãos ou ateus. Nem o copo, nem a caneta, a mesa ou o compasso se mexem por si só. O movimento sempre é feito por alguém bem vivo. Quando Faraday fez esta descoberta, as mesas curiosamente pararam de girar. Era como se a magia houvesse acabado ao ser exposta.
Mais curioso ainda é que isto não significa que é tudo uma simples fraude. Ao desvendar como a brincadeira do copo funciona, a ciência revela algo muito mais excitante que simples fraude. Ou mesmo almas penadas.
EFEITO IDEOMOTOR
Quando o químico francês Michel-Eugene Chevreul, descobridor da margarina, recebeu um pêndulo de presente em 1812, ficou realmente surpreso. Como haviam lhe dito, o pêndulo funcionava como um detector de forças ocultas: só oscilava quando segurado no ar sobre água, metais ou seres vivos. Ao colocar um material diferente entre o pêndulo e o metal, contudo, a oscilação cessava. Ele pôde constatá-lo por si mesmo, segurando o pêndulo. Não era fraude. Funcionava como mágica, como a brincadeira do copo.
Mas Chevreul era um cientista, e sabia que não basta eliminar a possibilidade de que outras pessoas o enganem. Também enganamos a nós mesmos.
O francês conduziu assim uma série de experimentos, entre eles o mais simples de todos, mas que ninguém havia feito até então. Simplesmente vendou seus olhos, e pediu que uma outra pessoa colocasse e retirasse objetos sob o pêndulo. Subitamente, sem poder ver, o pêndulo que segurava deixou de funcionar como um detector mágico de materiais.
Foi o mesmo que ocorreu com os tabuleiros Ouija. Pearl Curran, aquela que contatava o espírito de Patience Worth e que mencionamos na semana passada, simplesmente se negou a fazer a brincadeira com os olhos vendados. De olhos fechados, nem os espíritos nem as forças radiestésicas, nem quaisquer forças ocultas inteligentes funcionam. Não só o movimento sempre parte de alguém vivo, como ele só é coerente se os vivos enxergam o que acontece.
Por outro lado, Chevreul sabia que ele mesmo não estava fraudando o movimento do pêndulo. Talvez assim como a médium Curran. Suas expectativas estavam sendo transmitidas para o pêndulo ou o tabuleiro, mas inconscientemente. Este efeito inusitado seria chamado de efeito ideomotor, movimentos por vezes extremamente complexos e inteligentes, mas inconscientes. Surpreendente?
Em uma coluna anterior vimos como nossa própria consciência e livre-arbítrio não são bem o que parecem. Que movimentos inconscientes inteligentes acabem emergindo não deveria ser mais surpreendente que tal: é praticamente o mesmo que ocorre com nossa própria consciência. A única diferença é que tais movimentos não são percebidos como nossos.
O que nos leva finalmente aos zumbis.
ZUMBIS FILOSÓFICOS NO COPO
Lembra-se do experimento de Libet sobre o livre-arbítrio? Quase meio segundo antes de tomarmos uma decisão, nosso cérebro já toma passos em tal direção, exibindo o chamado “potencial pré-motor”. Inconscientemente.
Bem, se o potencial pré-motor já indicava que iríamos tomar uma decisão, não poderíamos criar uma máquina para prever nossas decisões antes mesmo que as percebamos?
Surpresa: esta experiência já foi feita. Em 1963, o neurofisiologista William Grey Walter convidou pessoas a controlar um slideshow com um botão. O que elas não sabiam é que o botão não estava conectado. O que sim estava conectado eram os sensores em suas cabeças, medindo o potencial pré-motor em seus cérebros. Assim que o potencial pré-motor para apertar o botão era detectado, o slideshow avançava.
O resultado foi enlouquecedor. Os participantes relataram que o slideshow parecia antecipar suas decisões, que eles só perceberiam quase meio segundo depois. Incrivelmente, a ciência demonstrou uma máquina pré-cognitiva há mais de quarenta anos. Novamente, Hollywood não ficou sabendo.
Claro, os experimentos de Libet e Walter não demonstram viagens no tempo: demonstram a ilusão de nosso livre-arbítrio. A brincadeira do copo, o pêndulo de Chevreul e todas as outras aplicações do efeito ideomotor também o fazem, com a diferença de que acabamos não percebendo que as decisões e idéias foram tomadas por nosso próprio inconsciente.
Walter, aliás, foi também um pioneiro da robótica, e seus robôs mais famosos foram as “tartarugas eletrônicas” Elsie e Elmer. Foram os primeiros robôs autônomos da história, antecedendo os aspiradores Roomba em meio século. Elas se movimentavam livremente, sem pré-programação, em busca de fontes de luz que indicavam onde podiam recarregar suas baterias. Seus movimentos aparentavam exibir algo muito humano: livre-arbítrio.
Acima: movimento das tartarugas-robô de W. Grey Walter.
Note o zigue-zague arbitrário.
Não por coincidência, a questão sugerida por Walter é muito relevante aqui. Se algo age exatamente como se tivesse livre-arbítrio e consciência, terá mesmo livre-arbítrio e consciência? É uma questão filosófica, e para alguns, a resposta é não. Mesmo que um descendente robótico das tartarugas eletrônicas de Walter se comporte exatamente como um ser humano, exibindo todas as respostas aparentes de consciência e livre-arbítrio, isso não significaria que os possui realmente. Faltaria algo, talvez uma alma, um espírito. Sem possuí-las realmente, seria um zumbi filosófico.
Mas todos os experimentos e casos que vimos demonstram que a consciência e o livre-arbítrio são muito mais complexos e nebulosos do que aparentam. Antes mesmo que nos deparemos com um Exterminador do Futuro capaz de se transformar em um amigo de John Connor e dizer “Hasta la vista, baby”, já convivemos com demonstrações claras de que fenômenos inconscientes podem ter toda a aparência de consciência.
Aquilo que parece estar dentro do copo não é um espírito: é um zumbi filosófico. E sua origem está em nossa própria mente. Não seria ela mesma um “zumbi”? Quebre o copo, e descubra uma parte desconhecida de sua própria mente.
