Veja bem o que escuta


Eae pessoas, trago mais uma novidade para vocês, com a coluna do Marcelo del Debbio no S&H, me surpreendi com a quantidade de pessoas interessadas e participando dos assuntos, sejam a favor ou não. Em uma conversa com o Kentaro Mori do ceticismo aberto falamos sobre uma coluna que agradasse aos céticos. Quero deixar bem claro que essa coluna vai abranger assuntos científicos, bugs do cérebro, ilusões e coisas do tipo, e não abordar nem debater os assuntos da Teoria da Conspiração, pois não é minha intenção criar um debate de quem está certo ou errado, apenas quem não gosta de uma assunto poder ter a opção de ler sobre assuntos de seu interesse. Minha intenção maior é demonstrar que um grupo pode respeitar o outro, então sem ataques ok? Qualquer dúvida sobre os comentários, leiam aqui. Eu ainda aconselho que façam como eu, acompanhem todas as nossas colunas que são muito bem escritas e tem ótimos assuntos =)
Bem, com vocês a primeira DÚVIDA RAZOÁVEL:

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Primeira coluna! Sou Kentaro Mori, e apesar de não ser devoto do padre jesuíta Quevedo, sou um “cético”. Um palavrão que espero poder apresentar melhor ao longo do tempo por aqui, graças ao eightbits. Mantenho o CeticismoAberto, o projeto HAAAN, e também participo de iniciativas como a revista Pensar; enfim, acredito em muitas coisas, como a de que é bom exercitar melhor o pensamento crítico antes de acreditar em qualquer coisa. Nessas primeiras colunas vou tentar explicar melhor o porquê.


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Ligue o som e clique no rosto de Arnte Maasø, um Mister M. de óculos, para escutar bem o que ele diz. Não é uma pegadinha para dar sustos: Mister M. está demonstrando uma das mais interessantes ilusões, e sem nenhum grande truque.

Pois bem, qual sílaba ele está repetindo? Agora repita o vídeo outra vez, mas desta vez apenas escute, com os olhos fechados, e diga: qual sílaba ele repete?

Pode ser preciso repetir o vídeo várias vezes, mas a maior parte das pessoas ao ver o vídeo escuta um dá-dá, mas ao ouvir apenas o som, escuta um bá-bá. Percebeu?

E o som que você escuta, sempre, é mesmo “ba”. Mas a imagem que você vê é de Maasø pronunciando… “ga”! Confrontado com dois estímulos conflitantes, o som “ba” e a imagem “ga”, o cérebro faz o melhor que pode e você percebe um “da” que não foi pronunciado em nenhum lugar!

O fascinante é que o efeito permanece mesmo depois que você sabe o que está acontecendo, basta fechar os olhos para alternar entre uma percepção e a outra. Este “bug” cerebral foi descoberto pelos pesquisadores Harry McGurk e John MacDonald, e foi apresentado em “Ouvindo Lábios e Vendo Vozes”, publicado em 1976 no respeitado periódico científico Nature. É o chamado “efeito McGurk“, que também ocorre com diversas outras sílabas parecidas combinadas com imagens conflitantes. E ele ocorre mesmo em frases completas, no mundo bem real.

Em um estudo publicado em 2005 (PDF), cientistas ingleses testaram como essa ilusão poderia afetar testemunhas de um crime. Para isso, exibiram a vários sujeitos o vídeo de um homem seguindo uma mulher. Ela percebe que está sendo seguida e começa a correr. Na pressa, sua bota cai. O homem pega a bota, mas continua atrás dela. No final, um outro homem que vê a cena grita uma de duas frases para a mulher: “He’s got your boot” (Ele está com a sua bota) ou “He’s gonna shoot” (Ele vai atirar). As frases soam de forma muito parecida em inglês.

Todos os participantes do experimento viram o mesmo vídeo, exceto na parte final: metade viu o homem gritar a mesma frase que ouviram, e a outra metade assistiu a ele gritar uma frase diferente daquela que realmente ouviram (como Mister Maasø acima).

O resultado: sem surpresa aqueles que viram e ouviram o mesmo, relataram o episódio com grande precisão. Mas aqueles que foram expostos a estímulos conflitantes cometeram muitos erros ao testemunhar sobre o final. Meio como a personagem da “velha surda”, contaram ter ouvido frases que não foram nem ouvidas nem vistas. O erro mais comum foi uma fusão de som e imagens que acabou coerente com o vídeo: disseram ter ouvido “He’s got your shoe” (Ele está com o seu sapato).

Vale repetir: nem o som nem o vídeo que essas pessoas assistiram continha a palavra “shoe”, sapato. Mas é algo próximo tanto de “boot” quanto de “shoot”, e também parece coerente com todo o episódio, já que chamar uma bota de sapato faz sentido. Confrontado com estímulos conflitantes, ambígüos, como nosso cérebro quase sempre está, ele tenta fazer o melhor que pode e no processo gera uma percepção que não estava realmente lá.

Isso nem sempre dá muito certo: algumas pessoas no experimento, exatamente como a “velha surda”, ouviram “booze” (bebida), “food” (comida) e até mesmo uma mencionou ter ouvido “glue” (cola). Por que o sujeito gritaria para a mulher que o homem atrás dela estava com uma cola? Nem o Mister M. explica.

Se tudo isso pareceu curioso, você também pode experimentar brincar com o efeito. Se você for algo como a Gyselle Soares, e estiver disposta a pagar um bom mico, pode dublar “Baba Baby” de Kelly Key. Com um detalhe: cantando “Gaga Gueigue”. Se tudo der certo, um vídeo com a música original e a sua dublagem irá resultar em uma percepção confusa de… “Dada Deide”. Faça isso em nome da ciência! E envie para o pessoal aqui do S&H!

Na próxima semana iremos um pouco mais fundo em nossos “bugs”. E talvez tenhamos um vídeo interessante para mostrar. 🙂